terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Expectorante - ou, “a impressão (....) de haver melhor em mim do que eu”

Catarro. Ultimamente o que ando mais produzindo são catarros. Começou em algum inverno de verão passado. Era nojento, e foi pouco. Hoje, posso dizer, não viveria sem. Sei lá, me acostumei. A existência foi sendo transviada até se resumir a piscinas de catarros, e mergulhos, e buscas e escarros.
No começo foi horrível, catarros com melecas estranhas me faziam acordar engasgado, quase vomitando no meio da madrugada, passava horas cuspindo na pia ou na privada. Até que naquele meio dormindo acordado, fui perdendo o nojo. Já que o estupro era inevitável, achei melhor relaxar e gozar. O conhecia com a língua, sua textura, seu gosto. O esmagava no céu da boca, brincava entre os dentes, lábios. Explorava com a mão, espalhava como luva, conhecia e guardava. Então fabulava histórias, certamente alguns alienígenas me infectaram. Era tão estranho, tão meu, que em pouco tempo já me causava agrado. Me senti especial brincando daquele jeito com catarro. Engolia, regurgitava. Até a meleca toda se diluir feito água. E isso me pareceu dignificador.
Nesses anos de trabalho já produzi todo tipo de catarro, do feito clara de ovo aos mais densos e esverdeados. Catarros com manchas escuras e avermelhadas, catarro amarelo, com uva passa, bege, com pelos, marrom, com peles... Certa vez fiquei até preocupado com um tom acinzentado, pensei que poderia ser massa encefálica. O médico não acreditou no que ouvia quando lhe explicava o prazer que aquela brincadeira me dava. Ofendeu-me dizendo que eu tinha uma doença vadia, indecente, nefasta. Despediu-me chamando-me de verme, desonra da raça. Eu bem já sabia o nojo que meu passatempo causava. Por todo lugar encontrei represária. Entre os amigos, virei motivo de repugnância e piada. Passei então a meticulosamente esconder meu pequeno ritual, percebiam apenas um insistente pigarro. E isso gerou um outro tipo de prazer. O almoço passou a ser um dos pontos culminantes. Toda a família reunida, e eu com uma técnica incrível fazendo aquela mistura, meio sagrada, meio profana. Um gosto proibido, único, um privilégio meu.
Mas nesse jardim nem tudo são flores, já perdi vários amores por conta do catarro. É a hora do beijo, é fatal. Não sei se pelo pescoço esticado, o movimento, a excitação. Não sei, sei que sempre vem. E é péssimo. Volto eu a vagar sozinho, cuspindo pro alto e deixando cair na testa, ou correndo atrás feito bêbado equilibrista. Fico como agora, ermo e mendigo, me sentindo um poeta maldito, um romântico tuberculoso.
Então sentado na borda da grande represa, meus catarros viram ilhas condenadas, sendo engolidas pelo oceano. Desaparecem como serei, eu e todo meu mundo humano, diluído, dissipado. Mas isso pouco me importava. Eu já havia resolvido boa parte do meu motivo quando você veio com seu jeito alegre e simples e, quase sem querer, unhou, conforme as voltas que a vida dá, algum segredo do meu coração. Por esses dias, ‘Ei, de que você tanto se protege?’, disse séria e despretendida. Depois, meu silêncio seguido de um inesperado ‘não sei’ irritou alguma coisa que estava calada. Desde então, algo importante está em perigo, sinto.

domingo, 8 de fevereiro de 2009

negativo

Os vizinhos gritam catarses de música sertaneja. As garotas ajudam num encontro até bonito. Se divertem todos cantando amores perdidos, dor maior. E dá-lhe risada e cerveja! E lambem sexo fácil. Como os invejo! Não sei mais essa alegria. Mesmo as noites de rock na adolescência. Alguma coisa de errado me irradia.
Acho que estou com câncer. Tenho os ossos que doem e a carne por ser descifrada. Algo voraz me devora. Os olhos ficam vazados. Projeto, e a volta me faz dissecado. Fico ao avesso, sem espaço, vago. Suicídio desencadeado. Me exorcizo escrevendo. Assim, mantenho-me enganado. Aflito, cavo meus próprios ciclos. Pobres células em metáfases. Purulam pelo meu corpo. Não podem paz. Correm cegas para o absurdo. Fico eu aqui sozinho. Implosão. Esta doença ainda me fechará em buraco negro...

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

reafirmo: ridículo.
âmago humano!