terça-feira, 6 de janeiro de 2009

inútil paisagem

Porta trancada, três palmas e a luz se apaga.
tim-tim, comemoram a virada.
Desço ansioso pelo fundos e deixo a casa.
aqui, nenhuma voz, nenhuma risada.

Na rua, a lua e sua calma prateada.
Paisagem que já não sustenta estandarte.
Mas a brisa da magnólia que se espalha
lembra a dama que me roubara.

Murmúrios infiéis povoam de incrédulos a madrugada,
diziam-me, “louco, isto é ridículo”.
mas sei de mim,
e depois do primeiro encontro,
só sei dela.

me retiro,
fico de sentidos atentos para o proibido,
sinto as criaturas da noite e seus filhos.
E quando você surgiu de surpresa -
como já o fazia há anos seguidos -
jogando as cartas na mesa,
não tive reação. nem eu acreditaria.

Desejo de séculos cravado em mim,
e você com seu pó mágico me embriagou,
cintilante e purpurina. Pintou minhas asas,
sorriu do meu sorriso, roubou-me o abrigo.

Nos levou até o mirante mais raro,
e lá brincamos de corpos e sangue,
pactos e sonhos, plantas e montes,
gozos e rizadas.

então contou-me histórias infinitas de reinos incontáveis,
mistérios dessa vida impossível e adorável,
maravilhas para as quais os humanos estão impermeáveis.
e, nesse embalo sereno e mágico,
encaixou-se, delicada, em meu peito,
e aos poucos,
fomos os dois levados.

Ao nascer o dia,
podia ver toda a cidade,
todas as portas estavam abertas,
e, feito valsinha,
os velhos casais dançavam.

Mas você já não existia,
e todo encontro era saudade.
Foi quando brotou na alma o tom santo de Jobim,
e me revelou essa maldade:
é o preço que se paga:
o resto, agora,
é inútil paisagem...

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